Entrevistas
Livro «Portugal A Pé» a partir da próxima semana nas livrarias
O jornalista Nuno Ferreira atravessou Portugal a pé, entre Fevereiro de 2008 e Novembro de 2010. Ao longo deste período, percorreu tudo o que havia para andar, desde bermas de estrada, percursos pedestres, leitos secos de rios, caminhos em terra batida, linhas de caminho de ferro abandonados, etc, para cumprir o objectivo deste projecto: reencontrar o país profundo, conhecendo e vivendo as tradições do Interior. A partir de dia 21 de Novembro, pode encontrar o seu relato nas livrarias, com o livro «Portugal a Pé», publicado pela Vertimag
Quando e porquê decidiste empreender esta ‘volta a Portugal’ a pé?
Já tinha esta ideia de atravessar o interior do país, o dito Portugal profundo há anos mas não tinha disponibilidade porque trabalhava num jornal diário. Em 2007, comecei a pensar em fazer a travessia a pé e fiz uma proposta à revista Única do Expresso.
Comecei em Sagres em Fevereiro de 2008 e escrevi crónicas semanais para a revista até Setembro desse ano quando criei um blogue e decidi continuar por minha conta.
A ideia foi sempre a de reencontrar o país profundo ou que dele resta com um ritmo, uma aproximação einteracção com as pessoas diferente daquela a que estava habituado quando fazia reportagens no jornal.
No decorrer da travessia do país, ao longo de 2 anos e 9 meses, quais os momentos mais marcantes que vivenciaste?
Toda a viagem em si foi muito marcante porque obriga-te a vivenciar o teu próprio país de uma forma muito directa, muito crua. Tu andas a pé, de mochila, exposto a todo o tipo de interpretações e reacções.
Não há maneira melhor de captar a essência do português, para o bem e para o mal. Apercebes-te das diferenças de terra para terra, dos sotaques, da maior ou menor hospitalidade e porquê.
Quais os momentos mais difíceis?
O momento fisicamente mais dificil foi quando estupidamente me perdi na Serra do Marão e tive de pedir ajuda aos bombeiros. Do ponto de vista psicológico, é difícil e duro quando caminhas 30 quilómetros para chegar a uma terra e és recebido com desconfiança.
Ficas a pensar: “Andei tanto para aqui chegar, que mal eu fiz? Será do cabelo? Será da barba?” Aos poucos, consegues derreter o gelo e socializar. Quando as pessoas percebem o que andas a fazer mudam completamente.
Quais os locais mais bonitos por onde passaste?
Foram muitos: Costa Vicentina, ilhas algarvias, as searas perto de Serpa, a região do Zêzere, Góis, o interior menos turístico da Serra da Estrela, o Bussaco, a Serra da Freita, a Serra de São Macário, a zona do Rio Paiva, o Douro, os lameiros junto ao rio Sabor entre Mogadouro e Macedo, Montesinho, Barrroso, Alvão, o Alto Minho…
Qual a reacção das pessoas quando conheciam o teu projecto?
As reacções eram as mais diversas. Havia as que achavam uma maluquice, outras não percebiam bem, outras ficavam fascinadas e encorajavam-me.
Encontraste diferenças entre os portugueses? Entre quem e de que forma?
Encontra-se diferenças até dentro da mesma região. Diferenças no sotaque, diferenças na forma de receber, diferenças na forma de viver a vida, diferenças na forma de ocupar os tempos livres.
E a conjuntura é muito importante. Num raio de 30 ou 50 quilómetros podes encontrar uma povoação deprimimida, com muito desemprego e as pessoas sem grandes sorrisos e logo à frente mudar tudo na povoação a seguir ou porque há mais gente nova ou porque há mais trabalho.
Que conselhos gostarias de deixar aqueles que um dia decidirem ‘fazer-se à estrada’?
Em primeiro lugar, gostava de encorajar as pessoas a fazer o mesmo. O conselho que tenho a dar é que não se deixem desencorajar pelas dificuldades iniciais e sigam em frente, comuniquem, mostrem às pessoas de zonas pouco habitadas que são gente de bem e que estão ali porque amam o seu país e o querem conhecer e a eles também.
Quanto à parte física, bebam água, muita água, comprem uns ténis para caminhar longas distâncias, mochila e equipamento impermeável, furem e sequem as bolhas mal elas apareçam, comam bem, procurem dormir bem e sejam felizes.
Quando terminou o ‘Portugal a Pé’ sentiste-te diferente? Em que sentido?
Senti que conhecia melhor o meu país e nesse aspecto, hoje sinto-me mais próximo tanto da natureza como das pessoas que vivem no campo.
É como fazer terapia e descobrires dentro de ti coisas que estavam algo encerradas num compartimento no cérebro. Vais para a estrada e no fim ficas com uma noção do Portugal que tu queres e gostas, dos portugueses que verdadeiramente interessam.
Qual o balanço que fazes deste projecto?
Apesar das interrupções e de um outro problema, adorei. É uma aventura na tua própria terra, uma aventura emocional e muito envolvente porque estás a atravessar o país onde nasceste e foste criado.
De repente, sentes-te a vasculhar a tua própria casa. Às vezes o que vês não é muito bonito, outras vezes é. Mexe muito com a pessoa.
Tendo em conta que, semanalmente, foram publicadas crónicas na revista Única (Expresso) e, actualmente, estão a ser publicadas no portal Café Portugal, o que traz de novo o livro para o leitor?
O que eu procurei ao escrever o livro foi quebrar o registo de crónica e publicar uma narrativa a eito, de sul a norte tal como a viagem, escrever o Portugal que fui vendo ao longo da estrada.
E agora, depois de lançado o livro, quais os próximos projectos?
Projectos tenho vários, o mais difícil é o maldito dinheiro. É algo de que gosto pouco de falar mas que é inevitável.
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